quinta-feira, 28 de novembro de 2013

da saudade...

Moro em um bairro distante do centro.
Bairro que vi crescer.
Bairro que havia:
Muros de pedras
Cheios de vistosas
Avencas e bálsamos,
Poucas casas,
Trilhas
Onde passavam
Lavadeiras
Lenhadeiras
Tropeiros








Onde todos se conheciam.
Que saudades tenho
Das brincadeiras
No final da tarde,
Do fogo aceso

No meio da cozinha
Dos casos de assombrações.

Que saudade!
De um tempo

Que não volta mais. 

(escrita da professora Liberalina em 18/07/2013)

inventando um pai





Saudade do pai, do meu pai. Meu pai nunca parou em casa e nem eu. Talvez, por isso, tantos desencontros. Lembro-me que à noite, quando ele deitava no sofá, às vezes, brincava de me jogar para o alto. Penso que chegava até o céu. 

Meu pai tinha olhos vermelhos, porque bebia, bebia as ruas de nossa cidade e chegava silencioso em casa. Homem bêbado, tímido e bom. Homem de ombros largos e inseguros. 

Às vezes penso que meu pai nunca existiu e vou criando histórias para ver se ele aparece dentro de mim. E me vejo pensando: como um homem com tantas histórias consegue viver no silêncio?

(escrito por Natália Goulart em 18/07/2013)


terça-feira, 12 de novembro de 2013

“não durmo na casa de ninguém porque tenho medo de não ter café”


"Cheiro da manhã
Cheiro do carinho
Levado pelo aroma
Do café da mamãe.

Pedaço de bolo,
Batata doce,
Angu doce,
Mandioca e a farinha de milho
Acompanhavam o sabor do café.

Tarde sem cheiro.
Tarde cansada.

Lá vem, lá vem,
O cheirinho do café.

Cheirinho do café,
Sabor do descanso
Sabor doçura

Sabor das lembras
Do aroma das manhãs."



(escrita da professora Cristiane Gomes Nonato em 18/07/13)

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

tempo, tempo, o tempo...


                                "Tempo
                                    
é tempo
Então vejo e revejo
Leio e releio
E o tempo?
O tempo?
O tempo passa,
Sinto saudade
Sinto-me feliz
Canto suspiro
Suspiro e digo

Amo a vida".

(escrita da professora Mônica em 18/07/2013)

do verbo ir...

"Mergulhando em minhas memórias


Minha vida escolar começou na pré-escola, na escola Santo Estevão no Bairro Rosário. Não me lembro da professora, nem de nenhum coleguinha. Primeiro dia de escola: saímos eu e meu irmão de mãos dadas com a nossa mãe. Não me recordo se ela já havia 
nos preparado para esse dia. Portão enorme. Entramos. Lá entro, várias crianças. Meu coração batia acelerado e descompassado. Segurei forte na mão da minha mãe, que conversava com uma funcionária da escola, professora talvez. Meu irmão já parecia mais familiarizado com o ambiente e meus olhos já não o viam mais, enquanto eu, só conseguia olhar para aqueles enormes portões.
Em certo momento, minha mãe disse que iria à padaria mas que voltaria logo para nos buscar. Nesse momento, a insegurança me invadiu. Comecei a chorar e a bater no portão. Meu irmão tentou me consolar, dizendo que não iríamos ficar para sempre, que nossa mãe voltaria em breve. Desse dia, só me lembro da nossa mãe voltando para nos buscar. De outros tempos, nesta escola, me recordo de uma senhora que lá trabalhava.Em momentos do nosso recreio, ficávamos em roda, esperando essa senhora que nos 
contava histórias. No ano seguinte, mudei de escola. Fui para a 1ª série, onde conheci a professora mais 
importante da minha vida: Dona Iolanda Miranda Walter. Nunca tive coragem para dizer isso a ela... e, há um tempo atrás,, minha mãe passou a cuidar da mãe dela, que já era idosa. Juntas, ficaram relembrando destes tempos e minha mãe acabou por contar esse meu segredinho de infância."

(escrita da professora Adriana Morais em 18/07/2013)

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

escrever está no centro do corpo





“escrever é simples, 

eu me descobri uma poeta” 




(fala da professora Sueli,
após a sua escrita)

sobre a poesia da memória

"Lembranças

Eu me lembro
Do progresso chegando
Primeiro, a tv a cores
Ligada na tomada
Crianças deitadas na cama
Embaixo do cobertor
Assistindo desenho animado.

Eu me lembro
Dos postes sendo colocados
Correria de homens enfileirados
Vai lá vai, vai lá vai
E um poste era trocado.

Eu me lembro
Dos carros invadindo as ruas
Roubando nossos espaços
Das brincadeiras vadias
Tocos de madeira impedindo
A passagem dos motoristas.

Eu me lembro
Das goiabas roubadas
Dos padrões desligados
Das campainhas tocadas
Correria pelas calçadas.

Eu me lembro
Das pipas e papagaios
Das mexidas com os cachorros
Das noites da quaresma.

Eu me lembro
Da educação recebida
Onde somente um olhar dizia
E você nem se atrevia
A contrariar seus pais.

Eu me lembro 
Da minha infância querida
Do meu primeiro beijo
Do primeiro celular


Lembranças e mais lembranças



Lembranças a vagar." 












(escrita da professora Pilar Inácio em 18 de julho de 2013)

o segredo dela

"Lembranças da minha infância


São tantas coisas que já se passaram e deixaram rastros de tristeza e alegrias, que são indescritíveis pra mim. De repente, posso falar sobre o meu passado passado ou do meu passado presente. Não sei, só sei que aprendi com o meu passado, que ficou perdido no tempo e aprendo com meu passado que é hoje e que se tornará passado amanhã. 
Sei que o meu passado (futuro) é dirigido por deus, que me conduz por onde quiser e me sinto muito feliz por isto. Falar do meu passado é relembrar uma infância feliz, cheia de brincadeiras e artes que terminavam em umas boas palmadas de minha mãe. É sentir falta da casa de minha avó, onde eu aprontava com meus irmãos, primos e amigos, onde o espaço físico nos dava a liberdade de criar muitas brincadeiras legais e também perigosas – minha mãe que o diga.
Segredo de Valéria"








(escrita da professora valéria em 18 de julho de 2013) 

o primeiro encontro

18 de julho de 2013, ouro preto, minas gerais. o dia começa um pouco frio, é inverno, e a cerração - palavra esquisita. - ainda toma o céu da cidade e, à frente, uma montanha imensa para ser subida até o ponto do nosso encontro; no alto do Morro Santana, entre algumas nuvens, a Escola Municipal Professora Juventina Drummond, um prédio grande, com cores novas e fortes depois de uma reforma recentemente terminada. Foram dois dias de oficina na escola, como parte da programação do Festival de Inverno de Ouro Preto e Mariana, tendo como participantes, professoras da rede municipal de ensino de Ouro Preto e Belo Horizonte.



As próximas postagens vão trazer algumas imagens e a escrita desses dias na escola, além de escritas novas que se fizeram a partir desse trabalho e fragmentos conceituais e práticos que propõem uma reflexão sobre a oficina que é ofertada nesses encontros.

  

no início era a palavra

Palavra prima
Uma palavra só, a crua palavra
Que quer dizer
Tudo
Anterior ao entendimento, palavra


Palavra viva
Palavra com temperatura, palavra
Que se produz
Muda
Feita de luz mais que de vento, palavra


Palavra dócil
Palavra d'agua pra qualquer moldura
Que se acomoda em balde, em verso, em mágoa
Qualquer feição de se manter palavra


Palavra minha
Matéria, minha criatura, palavra
Que me conduz
Mudo
E que me escreve desatento, palavra


Talvez à noite
Quase-palavra que um de nós murmura
Que ela mistura as letras que eu invento
Outras pronúncias do prazer, palavra


Palavra boa
Não de fazer literatura, palavra
Mas de habitar
Fundo
O coração do pensamento, palavra


(Uma palavra, Chico Buarque)




Antes do início, a palavra. Uma palavra silenciosa. A palavra que atravessa o pensamento e a construção de uma ideia que atravessa a palavra. Esse blog tem como fio condutor o encontro entre palavras e pessoas, a escrita como uma proposta, como uma invenção, um ofício.

E podemos nos perguntar: para que serve a escrita? Por que escrevemos? O que faz com que a mão mergulhe no mistério de uma folha em branco, "no chão de letras"? Talvez para que a palavra conte e descreva algo de nós e do outro, talvez para costurar nossas lacunas. Talvez e, simplesmente, para inventar dimensões de nós e da vida, a invenção da memória. Talvez para cuidar de nossas histórias. E não há ansiedade em responder, mas o que podemos dizer, quando se trata da escrita, é que ela é necessária...


O blog traz nas suas linhas um pouco do encontro experimentado, traz a escrita inventada nos dias de trabalho junt@s e a possibilidade de novas palavras que possam vir a chegar no depois. Cada letra que se alinha a outra e costura um narrar particular de cada uma, que se entrelaça a outras experiências-palavras de vida, um nó de histórias embebidas por afeto. 

Nesse encontro afetuoso entre palavras e pessoas, o corpo foi o texto e o texto foi o corpo, um corp'a'screver como escreve a escritora portuguesa Maria Gabriela Llansol. O escrever dentro do corpo e o corpo dentro do escrever, a volta metalinguística, experimentar o estado do/no enlace entre corpo e linguagem, um "cair no corpo" frase da filosofa e escritora Marcia Tiburi.  
    
A oficina visa trabalhar a diversidade/diferença pelo olhar da psicanálise e da arte, trabalhando corpo, afeto e memória. O trabalho se fará pela palavra através de duas vias: a palavra escrita e a palavra imagem, tendo por base as conversações – metodologia da psicanálise para o trabalho em grupo. O objetivo principal é pensar a subjetividade que atravessa os corpos dos atores sociais que compõem o cotidiano das ruas, escolas, universidades, casas, praças, ônibus e tantos outros espaços reais, simbólicos e imaginários. A ideia é costurar a possibilidade de intervenções – as saídas para lidar com as diferenças – nos espaços da educação, interrogando, de forma especial, a relação professor-aluno. A proposta é uma aposta no sujeito, enquanto aquele que para de ser falado para tomar a palavra e falar – é uma aposta nos encontros tendo como pano de fundo o patrimônio como esse lugar em que é possível se inscrever e escrever.